Uma estrangeira no mundo

"Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim." – Jo 15.18

Virou pecado ser protestante


Não, você não leu errado. Virou pecado ser protestante. O máximo que se pode ser é “evangélico”.

Muita gente não sabe, mas os chamados evangélicos nasceram protestantes. Em 1517, Martinho Lutero afixou suas 95 teses na porta da Catedral de São Pedro, onde denunciava algumas doutrinas heréticas da igreja cristã da época, como a venda de indulgências, a simonia, o nicolaísmo. Antes de Lutero, John Wycliffe e John Huss já protestavam, através de seus sermões. Wycliffe defendeu, em 1381, a insurreição camponesa, e Huss foi martirizado na fogueira por defender um Evangelho puro e simples como o de Cristo.

O termo “protestante” se originou do protesto de seis príncipes luteranos alemães, pois o imperador Carlos V revogou a autorização que tinha dado de cada príncipe estipular a religião de seu território. No início, os católicos passaram a chamar os rebeldes de protestantes, e depois os próprios adeptos passaram a se chamar assim.

E assim nasceram as igrejas protestantes, que com o passar do tempo, no Brasil, adotaram outra nomenclatura: evangélicas.

É interessante observar que não só uma nova nomenclatura foi adotada. Com o passar do tempo, foi-se limitando o caráter protestante e reformador do início. Se, com Lutero, houve uma tentativa de volta às raízes do Evangelho, com o passar do tempo esse movimento se reverteu, voltando aos poucos à quase realidade da igreja cristã de 1517, onde protestos e reformas são considerados termos pejorativos, atentados à instituição igreja.

E assim, nos dias de hoje, virou pecado ser protestante. Qualquer um que pense em se levantar contra o ensino de algum “ungido” é automaticamente taxado como “rebelde”, “fariseu” e coisas piores. Hoje, não é permitido ao cristão pensar, como não era em 1517: os “ungidos” pensam por nós, assim como a Igreja Romana pensava pelos fiéis de sua época. Hoje, temos que obedecer à “lei da semeadura”, onde Deus só nos dá se antes lhe dermos nosso melhor em troca, e só Jesus não basta, devendo o fiel fazer um monte de rituais para conseguir ser liberto, assim como em 1517 os cristãos tinham que comprar as relíquias dos santos para receber em troca uma passagem mais curta pelo purgatório. Hoje, dependemos da aprovação dos líderes evangélicos, assim como em 1517 o povo dependia da aprovação papal.

Enfim, voltamos à estaca zero. Todo o trabalho de pessoas como Wycliffe, Huss, Lutero, Calvino, Zwínglio, Wesley e tantos outros, parece que foi em vão. A igreja reformada, onde ainda existe, está limitada a seu gueto, preocupada apenas com seus poucos fiéis. A maior parte da igreja nascida protestante hoje é evangélica, e essa preocupa-se mais em expandir seu território e abarcar o maior número de fiéis debaixo do seu cabresto gospel, onde não é permitido pensar, muito menos protestar. Boa parte da igreja evangélica busca poder terreno, e para isso é preciso de ovelhas cegamente fiéis.

Porém, de 2008 para cá, tem pipocado em várias cidades do Brasil grupinhos de 3, 5, 10 pessoas, que se colocam diante de ministérios e eventos ditos gospel empunhando faixas com versículos bíblicos. São parte de uma tímida tentativa de volta às origens, tanto da igreja protestante quanto do Evangelho de Cristo, porém são considerados pela maioria esmagadora dos ditos evangélicos (pois sequer aceitam serem chamados de protestantes, negando assim sua própria história) como agitadores, fariseus, rebeldes, disseminadores de confusão. Na verdade, repete-se (em menor grau) o que aconteceu com Lutero e tantos outros, que foram excomungados e até mortos por protestar contra as heresias pregadas na época pela Igreja Romana. Agora, como no passado, protestar é um pecado.

Não dá para ser protestante sem protestar contra as heresias em nosso meio, assim como não dá para ser evangélico sem conhecer e pregar o verdadeiro Evangelho de Cristo. Talvez seja a hora de renomearmos boa parte das igrejas cristãs nascidas da Reforma, a partir das suas características, que mesclam misticismo extremo com doutrinas humanas em nome de Jesus. Que não vendem indulgências, mas vendem riquezas em troca de bons dízimos e ofertas, praticando abertamente a simonia. Que, como os nicolaítas, entendem que há crentes superiores a outros, havendo uns mais ungidos do que os outros. Que, como na infalibilidade papal, não permitem confrontações doutrinárias com suas lideranças sob a desculpa de que não se pode tocar num ungido de Deus.

Quem sabe boa parte das igrejas ditas evangélicas não devessem se chamar apóstolicas romanas do século XV?

8 comentários em “Virou pecado ser protestante

  1. Moacir Teles Maracci
    09/03/2011

    O texto da irmã é perfeito e deveria cortar de alto a baixo os “ungidos”. Na atual prática gospel (que alguns chamam de neopentecostal), decreta-se a morte do espírito crítico. No Antigo e no Novo Testamento, todos os patriarcas e profetas foram líderes, não transformaram seus fieis em massa de manobra. Pense em Abrahão, obediente a Deus até às últimas consequências, mas crítico, questionador até o cumprimento da promessa de levar seu povo à Terra de Canaã. As “lideranças” gospel de hoje são o que João Batista, precursor de Jesus já denunciava como “raça de víboras”. Será que precisamos voltar aos tempos duros de João Batista, abrindo mão da ternura e da sublimidade do ministério de Jesus Cristo? No ministério de Jesus não constava que o Mestre iria expulsar os vendilhões do templo na base do chicote, mas esses “ungidos” são realmente medonhos. Usam o aparato midiático para literalmente aliciar fieis, e não converter almas. Chicote neles!

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  2. Fabio Luiz
    09/03/2011

    Analise perfeita do atual contexto em que vivemos.
    O que esta acontecendo é que o povo parou de ler a Bíblia e não tem o conhecimento verdadediro da palavra.
    Vejo crescer vertiginosamente igrejas onde os textos Bíblicos são apresentados não nas Bíblias, mas em projetores de slides, onde fica fáciltirar o texto do seu contexto e dar a ele o sentido que se quer.
    A coisa funciona assim ah hoje não vou levar a minha espada para igreja não, minha igreja é modrena lá tem slide, vou carregar peso atoa não!
    Um forte abraço e um beijo no coração de todos, e que Jesus abençoe a todos, protestantes ou não.

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  3. «73n £1Øn»
    10/03/2011

    Duro é liderar uma igreja hoje, onde se prega o evangelho puro e simples. Em BH lidero uma igreja assim, sofro oposição dos “senhores” do bairro, dos neopentecostais e da turma do deixa disso. Já puve época em que pregávamos, e no meio da pregação dáva-mos os nomes aos bois, lendo João 10:10 (é o pastor e não o diabo, o ladrão no texto), Judas, 2 Pedro, 10 virgens. Hoje pregamos apenas o evangelho puro e simples, e na hora da oferta, (que não é a “hora mais importante do culto”) damos a consciência, liberdade e alegria para o ato em si.
    Muito coeso seu texto, como todos de sua autoria.
    em tempo: em BH não houve a marcha para Jesus para protestarmos (se lembra do meu contato contigo?) mas 2011 promete, ah, se promete.
    Abs.
    neilton, pastor.

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  4. «73n £1Øn»
    10/03/2011

    Vou repostar no paraessesdias.missaoreluz.org

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  5. O texto da irmã é perfeito e deveria cortar de alto a baixo os “ungidos”. Na atual prática gospel (que alguns chamam de neopentecostal), decreta-se a morte do espírito crítico. No Antigo e no Novo Testamento, todos os patriarcas e profetas foram líderes, não transformaram seus fieis em massa de manobra. Pense em Abrahão, obediente a Deus até às últimas consequências, mas crítico, questionador até o cumprimento da promessa de levar seu povo à Terra de Canaã. As “lideranças” gospel de hoje são o que João Batista, precursor de Jesus já denunciava como “raça de víboras”. Será que precisamos voltar aos tempos duros de João Batista, abrindo mão da ternura e da sublimidade do ministério de Jesus Cristo? No ministério de Jesus não constava que o Mestre iria expulsar os vendilhões do templo na base do chicote, mas esses “ungidos” são realmente medonhos. Usam o aparato midiático para literalmente aliciar fieis, e não converter almas. Chicote neles!
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  6. vezes7
    14/03/2011

    Disse tudo. Mesmo com o crescimento das seitas evangélicas, ainda temos homens e mulheres de Deus que tentam fazer a diferença no corpo de Cristo. Cansei de religiosidades e de pessoas caindo e gritando nos cultos, mas andam da mesma maneira vã de sempre. Não vemos ação de Cristo nas pessoas… só vemos emoção e show. Povo morno!

    Estamos no último período das igreja do apocalipse:

    Apocalipse 3:14-17: … Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente! Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca. Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu;

    Indico alguns blogs:
    http://voltemosaoevangelho.com/blog/
    http://vezes7.wordpress.com/
    http://jesussite.com.br/

    Continua firme, pois esse é o propósito de Cristo para sua noiva…

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  7. Rev. Luis Fernando+
    15/06/2011

    Belo texto…, só gostaria de frisar que Lutero afixou as 95 teses na Catedral de ~Winteberg em 1517 na Alemanha. A Catedral de São Pedro fica no Vaticano que é um país encrunhado na Itália conforme o Tratado de Latrão entre Mussolinni e a Igreja Romana.
    Paz do Senhor a todos

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  8. ridel
    01/01/2012

    Segundo as seitas neo-pentecostais e pentecostais e alguns segmentos dos protestantes históricos negam que façam parte e tenham a genese na reforma da qual são a parte mais deformada, sua exege bizarra é anti-cristã. é a maneira de tentar se livrar do anátema, assim seitas evangélicas não podem ser chamadas como sugerido apostólicas romanas do sec. xv, também não são protestantes idólatras.
    1SM15,23 Porque a rebelião é como pecado de feitiçaria: e o porfiar é como iniquidade e idolatria. O pai da mentira é o mesmo do protesto

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